“... não atentando nós nas coisas que se vêem, mas sim nas que se não vêem; porque as que se vêem são temporais, enquanto as que se não vêem são eternas”.
II Coríntios 4: 17
- Mas, você tem certeza de que vai comer outro pedaço de bolo, menina? – pergunta a mãe admirada de uma pequena garota de quatro aninhos de idade.
- Claro que sim! – responde a menina – está uma delícia!
- Será que não vai lhe fazer mal? – insiste a mãe – já é o terceiro pedaço!
- Pode deixar mãe, eu sou bem maior por dentro que por fora!
Talvez essa menina da história, em poucas palavras conseguiu resumir o grande drama humano. Esquecemos que interiormente somos muito maiores do que conseguimos expressar do lado de fora. Se nos mostrássemos ao mundo na mesma proporção que nos percebemos internamente, algo de paraíso e caos se estabeleceria com uma gravidade ainda maior que a que conhecemos atualmente.
Poucos meses atrás, li um pequeno, porém, muito interessante livro sobre oração. “Aprofundando o diálogo com Deus”, de Bem Patterson. Este é um daqueles autores que escreve poucas coisas com muito conteúdo, com muita profundidade. Lia, às vezes, um único parágrafo e ficava detido naquele pensamento por bastante tempo antes de prosseguir.
Ele escreveu algo sobre uma luta recorrente no nosso dia-a-dia, um dilema que enfrentamos, na maioria das vezes, sem perceber. Em um trecho de seu livro ele diz:
“A visão de Deus é que há uma realidade, mas duas dimensões: uma visível e a outra invisível. Mas, das duas, a invisível é a maior e a mais determinante. De fato, a realidade visível é, geralmente, a arena na qual o drama das realidades invisíveis acontece. É o invisível que dá significado ao visível. Em vez de negar o visível, o invisível determina e apresenta um ponto de referência. Assim, Paulo escreve sobre o seu trabalho como apóstolo, difícil e desalentador na esfera do visível, como algo que definido pelo invisível”.
FRÁGIL POR FORA, PODEROSO POR DENTRO
É uma prova de que o que vemos e vivemos sobre a terra é apenas uma manifestação do grau de conhecimento que temos sobre o que é eterno. Em todos os sentidos, os resultados visíveis das nossas decisões apontam para um grau maior ou menor que temos sobre o espírito eterno que nos habita e o Deus que habita a dimensão invisível que não dominamos.
“Por isso não desfalecemos; mas ainda que o nosso homem exterior se esteja consumindo, o interior, contudo, se renova de dia em dia. Porque a nossa leve e momentânea tribulação produz para nós cada vez mais abundantemente um eterno peso de glória; não atentando nós nas coisas que se vêem, mas sim nas que se não vêem; porque as que se vêem são temporais, enquanto as que se não vêem são eternas”. II Coríntios 4: 16,17
O problema é que, ao invés de atentarmos para o que é eterno, temos nos dedicado muito mais ao que é temporal, ao que é passageiro e, por não ser eterno, irrelevante E o que as pessoas, os códigos, a sociedade como um todo apresentam é o quão distantes se encontram da verdadeira relação que precisamos ter com Deus.
Como ocorre isso? Na medida em que o temporal se torna mais importante para nós que o permanente. Quando valorizamos os efeitos muito mais do que o que os causa. Priorizamos os resultados mais que as ações que nos levaram a eles. Amamos as coisas visíveis e não percebemos que tudo, inclusive a nossa decisão de amar as coisas, nada mais é do que o resultado do nível de interesse que temos pelas coisas invisíveis e eternas.
Carregamos uma eternidade dentro de nós que, se não for percebida, discernida e valorizada adequadamente poderá nos tornar escravos das coisas visíveis e réus eternos das que realmente importam – as coisas invisíveis. O que significam essas coisas? Primeiro responda: em que dimensão você se relaciona com Deus? Na dimensão invisível. O relacionamento que você desenvolve com Deus vai determinar a sua reação no mundo dos sons, dos toques e sabores. Porém, a recíproca é verdadeira. O não relacionamento com Deus irá gerar em você um outro tipo de atitude em relação ao mundo.
A forma com que usamos a água potável do planeta, a atenção ou não que damos aos miseráveis ao nosso redor, a ética que desenvolvemos e a seriedade ou não com que buscamos a paz no mundo, nada mais são do que evidências do quanto estamos ou não envolvidos com o que realmente importa para Deus: a eternidade que nos habita. E, antes que você comece a perguntar: “e eu com isso?”, deixe-me esclarecer.
Um bom exercício para a vida seria perguntarmos ao nosso coração, antes de qualquer atitude, sobre qual é a dimensão que estamos valorizando, se a temporal ou a eterna. Ex.:
Amor é temporal ou eterno?
Trabalho é temporal ou eterno?
Saúde é temporal ou eterna?
Beleza física é temporal ou eterna?
Arnaldo Jabor escreveu um livro intitulado “Amor é prosa, sexo é poesia”. No crivo do que é temporal ou eterno eu diria que amor eterno, enquanto sexo é temporal.
Então, sobre o que eu quero alertar? Que temos dirigido nossas vidas a valorizar muito mais o que é temporal do que o que é eterno. Mas o que não percebemos é que iremos ser avaliados diante de Deus pelo que é eterno e não pelo que é temporal, visto que o que é temporal é apenas conseqüência daquilo que é eterno.
Se a sua carreira é mais importante para você do que a forma com que você pode usá-la para glorificar ao Senhor, então você tem se deixado envolver mais pelo que é temporal do que o eterno.
O desafio é perceber que as coisas temporais que fazemos ou experimentamos devem ser apenas reflexos, ou conseqüências do tipo de relacionamento com Deus que estamos desenvolvendo. Mesmo porque, entre outras coisas, vamos valorizar menos a imagem que passamos para as pessoas ao nosso redor e mais a percepção de quem realmente somos.
É o que faz o apóstolo Paulo ser aparentemente controverso, quando afirma que “a nossa leve e momentânea tribulação”, quando nós conhecemos um pouco de todo o sofrimento por ele experimentado para servir a Jesus com fidelidade. É que, aos olhos de quem discerne o eterno, não há tribulação, enfermidade, traição, dificuldade, ameaça, covardia ou medo que lhe roube a convicção de que está protegido nos braços do Senhor. “Quem nos separará do amor de Cristo?” (Rm 8:31), ele pergunta, com os olhos voltados para o que é eterno e não temporal!